Disciplina - Física

Física

04/11/2009

Software avalia efeitos da radiação eletromagnética emitida por celular

Pesquisadores da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, em parceria com a Fundação CPqD, acabam de desenvolver um software capaz de avaliar os efeitos, em seres humanos, da radiação eletromagnética emitida por aparelhos celulares, especialmente na cabeça. E os resultados obtidos até o momento são positivos – segundo testes preliminares, os equipamentos não causam riscos aos usuários. O acordo de cooperação entre a Unicamp e o CPqD se deu no âmbito do projeto “Telecomunicações e impactos na saúde e no meio ambiente”, financiado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento das Telecomunicações (Funttel).
A principal característica deste software, batizado de BR-SAR, é ser uma ferramenta computacional com interface bastante amigável, de fácil manuseio para o pessoal técnico que possua conhecimento dos modelos matemáticos envolvidos. Durante dois anos, a equipe de pesquisadores da Unicamp, liderada pelo professor Hugo Enrique Hernandez Figueroa, desenvolveu em conjunto com a equipe do CPqD, um pacote computacional e realizou testes do simulador, cujo modelo representa o comportamento da cabeça humana da forma mais fiel possível. “Trabalhamos com o que está disponível em bibliotecas de hospitais e centros de pesquisa da área médica”, afirmou Figueroa.
Após a montagem das geometrias adequadas a cada modelo de aparelho, o programa executa o cálculo da distribuição de campos eletromagnéticos em todo o espaço. A partir daí, o software calcula a distribuição de temperatura e, também, de um parâmetro denominado SAR (Specific Absorption Rate), que significa taxa de absorção específica dos tecidos. Esse é o parâmetro que representa o efeito da radiação eletromagnética nos tecidos. Nesse momento, ele verifica se o que é emitido pelo aparelho está de acordo com a regulamentação brasileira.
O professor Hugo Enrique Hernandez Figueroa: “Trabalhamos com o que está disponível em bibliotecas de hospitais e centros de pesquisa da área médica” (Foto: Antoninho Perri)Figueroa explica que seu grupo desenvolveu ao longo dos últimos dez anos técnicas sofisticadas de cálculo de radiação eletromagnética, motivo pelo qual determinou a colaboração com o CPqD. “A nossa experiência em trabalhar com esse tipo de modelagem resultou no contrato de colaboração”, disse. Ele revelou que o grupo atingiu um nível muito bom no desenvolvimento do simulador. Esse produto deverá servir como exemplo para outros aplicativos e facilitará a interação com outros grupos e outros pesquisadores que não trabalham com a parte de simulação. Na opinião do professor, muitos pesquisadores precisam dessas ferramentas e se elas não possuem uma interface amigável, isso torna a sua utilização um pouco mais complicada.
O desenvolvimento do BR-SAR servirá de apoio às atividades que o CPqD vem desenvolvendo na área de comunicações sem fio, em especial a de testes da SAR dos aparelhos celulares. Certificar um equipamento com larga escala de utilização é, conforme Figueroa, uma contribuição importante em termos sociais. Trata-se de um modelo que continuará sendo aprimorado porque certamente novos efeitos surgirão e serão incorporados. Figueroa cita o exemplo do fluxo sanguíneo. “Como modelar isso? Estamos com uma ferramenta de enorme potencial e com fortes tendências de crescimento”, ressaltou. A pesquisa gerou seis trabalhos de iniciação científica – desenvolvidos em parceria com a professora Marli de Freitas Gomes Hernandez, da Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp –, uma dissertação de mestrado, uma tese de doutorado e registro da patente do software que está em andamento. “As metas foram atingidas”, concluiu Figueroa.
Diante da impossibilidade da realização de testes em seres humanos, o centro de pesquisa passou a buscar uma alternativa para o desenvolvimento de técnicas de simulação baseadas em modelos matemáticos e ferramentas computacionais. Foi nesse momento que o conhecimento e a experiência adquirida pela equipe do professor Figueroa passou a fazer parte desta modelagem matemática que trata da interação entre as ondas eletromagnéticas e o tecido humano. Para Antonio Marini de Almeida, do CPqD, é necessário conhecer as propriedades, entender e modelar o processo do ponto de vista eletromagnético.
Além de atuar na parte computacional no desenvolvimento de software, o pesquisador contou que outra ação realizada pelo CPqD no âmbito desse projeto, foi validar o que havia sido desenvolvido em termos de modelo matemático, que, assegura Marini, tem uma realidade virtual que precisa ser trazida à realidade física de um laboratório. O objetivo é tentar que as duas realidades sejam coerentes, de forma que os resultados sejam confiáveis.
As medições da SAR são realizadas por um instrumental que reproduz as características humanas. Este instrumental é composto por um sistema robotizado para medição do campo elétrico em um boneco que reproduz a cabeça humana. O telefone é colocado numa determinada posição, na forma como será a exposição durante o seu uso normal, para verificar qual é a interação produzida pelo equipamento do ponto de vista da exposição eletromagnética.
Os testes de validação no laboratório tentam reproduzir o mundo virtual no mundo real, através de medidas reais. Marini ressalta que é importante observar que nesse processo não há certo ou errado. Não é possível afirmar que os resultados da simulação ou os resultados do laboratório estão corretos. “Os resultados têm que convergir, porque as duas realidades, a virtual e a real, têm que se encontrar”, afirmou.
Do ponto de vista do software desenvolvido, a obtenção de medidas a cada milímetro ou décimo de milímetro é feita sem intercorrências. Já no laboratório, essas medidas só podem ser realizadas por robô. A precisão também é muito grande, porém, o tempo para a realização destas medidas é muito grande, o que impossibilita este tipo de avaliação. É importante ressaltar que um ou dois milímetros de distância dos sensores da sonda que mede a emissão de ondas eletromagnéticas em relação ao simulado provocam resultados completamente diversos. “Nós conseguimos que os resultados convergissem, tanto na simulação como na medida de laboratório”, contou Marini.
O pesquisador Antonio Marini de Almeida, do CPqD: “Nós conseguimos que os resultados convergissem, tanto na simulação como na medida de laboratório” (Foto: Antoninho Perri)Na opinião do pesquisador, uma aplicação do software desenvolvido no projeto é o seu uso durante o desenvolvimento de novos aparelhos, pois há a necessidade da realização de testes para a medição da SAR. Um simulador reduz esse tempo porque, ao invés de construir fisicamente o telefone celular, ele pode ser avaliado pelo simulador. Quando o primeiro protótipo do aparelho chegar para avaliação laboratorial, já haverá dados pré-avaliados, o que torna essa aplicação bastante interessante.
Segundo Marini, há outros grupos no Brasil com desenvolvimentos de simulação da SAR, mas este software foi desenvolvido para ter uma interface de usuário muito amigável. Há uma facilidade muito grande no desenvolvimento do trabalho, na obtenção de resultados e na realização da simulação. O software trabalha em três dimensões (3D) e com rotações. Para as partes envolvidas isso é bastante importante porque, para a Unicamp, ele atua como suporte na parte de estudos e desenvolvimento de pessoal, enquanto que para o CPqD, é fundamental para analisar telefones com tipos diferentes de antenas. “Essas são as aplicações mais importantes que nós vimos nos resultados obtidos”, garantiu.
Outro viés da pesquisa, informado por Marini, diz respeito ao trabalho realizado pela bióloga e geneticista responsável pelo Laboratório de Citogenética e Cultivo Celular do Hospital da Mulher – Caism/Unicamp, Juliana Heinrich, objetivando resultados com relação à exposição da radiação em células humanas. Ela concluiu em sua pesquisa que o nível de radiação dos aparelhos celulares não causa danos aos cromossomos humanos. Os níveis de radiação emitidos pelos aparelhos encontrados no mercado brasileiro, de acordo com a bióloga, estão entre 1,5 e 1,6 watts/kg. As ocorrências de danos nos cromossomos humanos foram verificadas apenas quando a exposição à radiação foi superior em aproximadamente dez vezes ao limite permitido pela Comissão Internacional para Proteção contra Radiações (ICNIRP), de 2 watts/kg. Isso evidencia que os limites no Brasil, referendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), estão adequados. “Tem gente que pensa diferente e respeitamos, mas no nosso entendimento o que existe de legislação no Brasil é suficiente para a segurança da população, do ponto de vista dos terminais e das estações”, concluiu.
Na área de telecomunicações hoje no Brasil, todo produto antes de entrar no mercado passa por um processo de certificação, coordenado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Cada modelo lançado pelos fabricantes é submetido à bateria de testes, sendo que um é a medida da SAR, cuja avaliação é feita no CPqD. “Nenhum dos modelos vai para o mercado se não atingir as especificações”, atestou o pesquisador Antonio Marini de Almeida, do CPqD.
Fonte: Jornal da Unicamp (02 a 08/11/2009)
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