Disciplina - Física

Física

17/01/2011

À procura da antimatéria

Por Elton Alisson - Agência FAPESP
A revista Physics World, do Instituto de Física do Reino Unido (IOP), elegeu as dez maiores descobertas na área em 2010. Em primeiro lugar, ficaram os experimentos relacionados à pesquisa sobre a antimatéria realizados por dois grupos internacionais de físicos no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (Cern), um dos quais integrados por brasileiros.
Em novembro de 2010, uma equipe de pesquisa do experimento Alpha (Antyhydrogen Laser Physics Apparatus), composta por 35 cientistas de diferentes nacionalidades, entre os quais os brasileiros Claudio Lenz Cesar, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Daniel de Miranda Silveira, do Laboratório Riken, no Japão, conseguiu aprisionar, pela primeira vez, por 170 milissegundos (milésima fração de segundo), 38 antiátomos de anti-hidrogênio – equivalentes na antimatéria aos átomos de hidrogênio.
Algumas semanas depois, outro grupo, do experimento Asacusa (Atomic Spectroscopy and Colisions Using Slow Antiprotons), anunciou a criação de um novo capturador de átomos de anti-hidrogênio que poderá ser utilizado para estudá-los com a ajuda de micro-ondas.
De acordo com os editores da Physics World, as descobertas sobre o anti-hidrogênio realizadas pelos dois grupos no Cern ficaram em primeiro lugar no ranking elaborado pela publicação, porque deverão tornar possível realizar estudos mais precisos sobre os antiátomos. E, ao compará-los com os átomos de hidrogênio, poderão esclarecer um dos maiores mistérios da física: por que há mais matéria do que antimatéria no Universo?
“A física não tem um bom modelo para explicar a ausência no Universo da antimatéria, que é criada juntamente com a matéria e é o espelho dela, mas com carga trocada”, disse Lenz Cesar à Agência FAPESP.
“O fato é que não existe antimatéria naturalmente no Universo, porque, se houvesse, ela se encontraria com a matéria e as duas se aniquilariam, produzindo raios gama e outras partículas”, explicou.
Segundo o cientista, uma das pistas para uma melhor explicação da desigualdade na distribuição de matéria e antimatéria pode estar na violação do Teorema de CPT (carga-paridade-tempo) da física de partículas.
O teorema prevê que os antiátomos, enquanto compostos por partículas de cargas inversas às que compõe os átomos normais, devem ter as mesmas características desses, como por exemplo, os níveis de energia e seus tempos de vida.
A descoberta de uma diferença entre os níveis de energia de um antiátomo de hidrogênio com relação aos de um átomo do mesmo elemento químico pode ajudar os físicos a entender porque não há antimatéria naturalmente no universo. Isso provocaria uma mudança radical na física.
“Se os níveis de energia do átomo e do antiátomo de hidrogênio forem iguais, continuaremos sem uma boa explicação para a ausência de antimatéria no Universo. Mas, se forem diferentes, será necessário reescrever a teoria fundamental da física”, disse Lenz Cesar.
Para fazer a comparação, a equipe Alpha, integrada pelos brasileiros, pretende começar a realizar em 2012 medições com alta precisão dos níveis de energia dos antiátomos de hidrogênios que conseguiram aprisionar em novembro com o uso de campos magnéticos e elétricos intensos e temperaturas muito baixas.
Já bastante frios e caminhando lentamente pela armadilha magnética utilizada para capturá-los, para medi-los os pesquisadores reconstruirão equipamento que montaram para capturar os antiátomos de hidrogênio de modo a permitir a entrada de laser por janelas ópticas no sistema.
Ao interagir os antiátomos de hidrogênio com o laser por um longo tempo, os cientistas pretendem ver, pela primeira vez, a estrutura hiperfina dos níveis de energia das partículas e compará-los com os dos átomos de hidrogênio – o que pode fornecer a evidência para a violação do Teorema de CPT.
“Hoje, mesmo que não consigamos resfriar mais os antiátomos de hidrogênio aprisionados, teríamos a possibilidade de comparar os níveis de energia da matéria e da antimatéria em precisão de partes em 1011. A medida atual com hidrogênio, da diferença de energia entre os níveis 1S e 2S, tem 14 algarismos significativos. Mas, nesse experimento, temos a expectativa de fazer a medição com uma precisão insuperável, que até hoje ninguém conseguiu”, afirmou.
Participação brasileira
De acordo com Lenz Cesar, os pesquisadores brasileiros exercerão um papel muito importante no novo experimento. O laser que será utilizado no equipamento para visualizar os antiátomos de hidrogênio está sendo projetado paralelamente na UFRJ e em Genebra, na Suíça, onde está localizado o Cern.
Além disso, o segundo cientista brasileiro que participa do projeto, Silveira, é o atual coordenador técnico do projeto colaborativo de pesquisa. “Ele vai consolidar os desenhos técnicos do novo experimento, que é uma posição extremamente importante em um experimento desse alcance”, contou.
Orientado por Lenz Cesar em seu doutorado e primeiro pós-doutorado, na UFRJ, Silveira seguiu para o Cern em 2006 para realizar seu segundo pós-doutorado. E, após quatro anos no laboratório suíço, deverá retornar ao Brasil em agosto de 2011, para lecionar na UFRJ.
Lenz Cesar começou a participar do projeto desde o início, em 1996, após concluir seu doutorado no Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT). Durante o curso, o físico brasileiro fez uma das medidas mais precisas já realizadas sobre os níveis de energia do átomo de hidrogênio, que os pesquisadores pretendem repetir, agora, com os átomos de anti-hidrogênio.
“Esse trabalho, do ponto de vista da física fundamental, é o sonho de qualquer físico. É um experimento difícil, de longo prazo, e que poderá mexer com as bases da física atual”, disse.
Esta notícia foi acessada em 17/01/2011 no sítio Agência FAPESP. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor
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