Disciplina - Física

Física

30/10/2007

Fundamental, mas pouco conhecido

A influência dos aerossóis na formação de nuvens e sua conseqüente relação com o clima da Terra é uma das principais questões a serem resolvidas pelos cientistas para compreender as mudanças climáticas. A afirmação é de Paulo Artaxo, professor titular e chefe do Departamento de Física Aplicada do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).

“Conhecemos pouco sobre a ciência que está por trás dos aerossóis, mas essas partículas são determinantes para entender os impactos das mudanças climáticas no planeta”, disse Artaxo à Agência FAPESP durante o 11º Congresso Brasileiro de Geoquímica, encerrado na sexta-feira (26/10), em Atibaia (SP).

Segundo ele, a grande concentração de nuvens no Brasil torna ainda mais expressivos tais estudos. Os aerossóis podem ser formados naturalmente pelas florestas ou emitidos por ação antropogênica. Da emissão por queima de combustíveis fósseis às altas taxas de desmatamento na Amazônia, é perceptível a influência do homem no aumento da concentração dessas partículas na atmosfera.

No Brasil, 75% das emissões decorrem das queimadas na Amazônia, daí a concentração dessas partículas naquela região. De acordo com Artaxo, os aerossóis têm grande influência na formação de nuvens e na fotossíntese das plantas.

O físico explicou que as partículas geradas pelas queimadas fazem as vezes de núcleos de condensação na atmosfera, unindo gotículas suspensas no ar para que elas precipitem em forma de chuva. Quando o ar está saturado dessas partículas, no entanto, as gotículas não conseguem se unir. São formadas grandes nuvens que não precipitam.

“As nuvens têm grande importância no resfriamento da atmosfera, pois refletem a radiação solar de volta ao espaço”, contou. As queimadas no arco do desmatamento, no leste da Amazônia, formam uma grande pluma de aerossóis que reduz a radiação solar por onde passa. “O efeito de retirada de calor dessa nuvem é mais de 20 vezes maior do que o aumento do calor provocado pelos gases do efeito do estufa.”

A intenção de Artaxo e dos pesquisadores do Experimento em Larga Escala Biosfera-Atmosfera da Amazônia (LBA) – grupo internacional de cientistas que estuda as relações entre o uso da terra e o clima amazônico – é comparar os efeitos das queimadas da região com outras áreas poluídas do mundo, como a Índia.

Outra conseqüência dessas nuvens é a influência na fotossíntese das plantas. Os aerossóis interferem na irradiação solar e, em um primeiro momento, ela fica mais difusa e aumenta a fotossíntese das plantas, que preferem esse tipo de luz. Mas quando a quantidade de aerossóis aumenta e freia totalmente a radiação do sol, a capacidade fotossintética das plantas decresce sensivelmente.

“Serão precisos muitos estudos ainda para compreender o funcionamento da atmosfera”, destacou Artaxo. Baseado nos estudos do LBA, ele explica que, caso a ocupação territorial desordenada continue, as emissões provenientes das queimadas poderão ser o dobro daquelas oriundas de uma Amazônia explorada sustentavelmente.

Questionado pelo geólogo Hubert Roeser, da Universidade Federal de Ouro Preto, sobre as incertezas dos dados do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), Artaxo reconheceu que a questão é tema de muita controvérsia entre os cientistas. “Há muitas dúvidas, mas isso não quer dizer que nós não devemos fazer nada.”

Papel agrícola

Se forem considerados apenas os combustíveis fósseis, o Brasil é o 17º maior emissor de gases do efeito estufa (GEE). Mas, com a inclusão da agropecuária e das mudanças no uso da terra, o país salta para a quarta posição, o que faz com que reduzir as emissões dessas duas fontes se torne importante desafio para o país na questão das mudanças climáticas.

Segundo Adolpho José Melfi, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e ex-reitor da universidade, que também participou da conferência em Atibaia, a agricultura pode contribuir com a redução das emissões.

“A atitude a ser tomada é diminuir as fontes de emissão e aumentar os sumidouros”, disse, apontando os biocombustíveis como uma das ferramentas para atingir esses objetivos.

Melfi também destacou as diferenças entre a colheita da cana-de-açúcar de forma mecanizada e a manual, que provoca a queima da palha. “Atualmente, apenas 20% da colheita é feita sem queima, se atingirmos 50% o balanço entre seqüestro e emissão seria um ganho de em média 3 milhões de toneladas de dióxido de carbono por ano”, disse.

Com a produção de etanol, em substituição ao combustível fóssil, mais 10 milhões de toneladas de carbono deixariam de ser emitidas, segundo o professor da Esalq. Soma-se ainda o uso do bagaço da cana nas caldeiras da usina, no lugar do combustível de origem fóssil: menos 8 milhões de toneladas na atmosfera. “Na soma, o Brasil poderia reduzir as suas emissões em 21 milhões de toneladas de dióxido de carbono todo ano”, afirmou.

Melfi comparou ainda o plantio direto com o plantio comercial. A movimentação da terra pelo maquinário agrícola retira a cobertura orgânica do solo e provoca a mineralização do dióxido de carbono.

Por sua vez, o plantio direto mantém a palha da cana no canavial protegendo o solo e permitindo que a matéria orgânica volte a se agregar à terra. “A economia é de 15 quilos de carbono por hectare todo ano. Se multiplicarmos por todas as plantações, temos mais uma forma de reduzir as emissões”, disse.

Por Murilo Alves Pereira, de Atibaia (SP)

Fonte: Agência FAPESP

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